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Cesar Nascimento

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Novamente menino

Num reino que imaginei quando infante,
Minha rainha tinha os olhos teus.
E naquele reino, agora distante,
Eu enfrentava a inveja de Deus.

Mas eis-me velho, sabido, cansado,
Desenganado e entre os filisteus.
Foi-se a rainha e o reino dissipado.
Morto o menino, seu sonho morreu.

Mas a despeito do passado inglório,
Vi que o destino jamais me esqueceu,
Pois só com o brilho que sai de teus olhos,
Tu me tornaste o maior dos plebeus.

 

Cesar Nascimento, Nuvem

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Fazer política

Fazer política é tarefa comum.
Conquista-se um voto,
Eleva-se um ponto:
Metade mais um.

Fazer política não é complicado.
É saber costurar
Quando a linha faltar
Ao já mal remendado.

Fazer política é fazer-se calado,
Esquecer o que ouvir
E não mais discutir
O que for acordado.

Fazer política é fazer a notícia;
É ser bem comentado,
Para não ser cassado
E encarar a polícia.

Fazer política só tem um mistério:
O segredo é fugir
Quando se houver de rir –
O político é sério!

 

Cesar Nascimento, Nuvem

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Pequeno Lamento

Perdoa-me, amor, meu pranto,
Que me custa portar-se assim.
Perdoa-me e foge de mim.
Perdoa-me por tudo, por nada.
Perdoa-me pelo que não fiz.
Mas perdoa-me, amor, calada,
Que já hoje não sou feliz.
Sim, meu amor, perdoa-me
Por tudo o que ainda te peço.
(Eu sei que é caro o perdão.)
Perdoa esse amor confesso.
Perdoa esse amor em vão.

 

Cesar Nascimento, Nuvem

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – O Nome da rosa

A rosa é tão doce
Que, não fosse rosa,
Ainda rosa seria.
O nome de rosa,
Em verso ou em prosa,
É tudo o que
A rosa não tem.
A rosa tem somente
Aquilo que ela é:
Rosa apenas
E rosa também
Quando ainda em seu botão
Ou, já quase uma não-rosa,
É só pétalas no chão.

 

Cesar Nascimento, Nuvem

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Poema náutico

Como querer te comparar ao mar
Se o mar é parte do que cabe em ti,
E se o resumo disso que senti
É o só desejo de te navegar?

Por ti me ponho a enfrentar o mar,
E navegar-te é meu maior prazer.
E além de tudo que eu puder dizer,
Conservo o sonho e o querer te amar.

Mas eis que surge na procela um vão,
E o vento, a onda, escuridão sem fim
E o mais que habita tua imensidão
Transtornam nauta e nau em não e sim,

Como se o vento os quisesse virar,
E o navegante não dá mais de si
E o rivaliza e joga a vela ao mar,
Eis que disposto a naufragar em ti.

Cesar Nascimento, Nuvem

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Amor indivisível

Dizem que o amor faz de dois um.
Sim, mas não completamente!
Dois são um quando um, ausente,
Ressurge no sonho do outro,
Que acorda com olhos dormentes
E sonha de dia, acordado.

Dois são um, sim, e se amam,
E, no entanto, é amor incompleto,
Pois, amantes, seus corpos reclamam
O direito de se ter mais perto,
De dormir também um, apertados,
Com a boca úmida, quentes, suados.

Cesar Nascimento, Nuvem

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Lição de vida

Sou muito feliz assim, sozinho.
Sinto a solidão como uma estrada,
Que do meu vazio leva a nada.
Nunca alguém se põe no meu caminho.

Posso mais querer que o passarinho,
Que não tem amor, ciúme ou pranto?
Sem poder sofrer tal desencanto,
Largo eu vôo e plácido definho.

Tenho mil razões para esse jeito
Meu de ser assim tão afastado
Das mais vis tristezas que não tive.

Mas não conto – eu, que sou calado –
Como se alcança o fim perfeito.
Não vou te ensinar como se vive!

Cesar Nascimento, Mensagem do Exílio 

Cesar Nascimento

Cesar Nascimento – Entregue-se ao tempo

Não tenha medo de morrer
Não tenha pressa
Viva seu termo com calma
Não tenha pressa
Aproveite o momento
Mas faça seus planos
Nem tudo acaba agora
Procure o mais lento
Espalhe-se sobre os anos
Conquiste o futuro
Não tenha tantos amores
Que não lhe sobre tempo
Proteja-se do medo
De estar perdendo
Se a vida lhe apressar
Jamais se apavore
Só há uma vida, só uma
Mas uma é bastante
Perceba que a calma é virtude
Que afasta o sofrimento
Evite os abandonos amiúde
E entregue-se ao tempo

Cesar Nascimento, Mensagem do Exílio