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Saulo Ramos

Saulo Ramos

Saulo Ramos – Poema a meu pai

Saulo Ramos

Meu pai, eu sou tua ressurreição,
herdei-te o rosto, a fé e o sentimento,
herdei-te a paz, o dentro mais profundo.
Ao caminharmos para a perfeição
tenho a impressão de que, certo momento,
fomos um só na criação do mundo.
 
Viemos de geração em geração,
iguais na vida e morte, que é semente,
multiplicados a nos renascer,
sentindo, a cada nova criação,
o outro querendo ser eternamente
o que um não teve tempo para ser.
 
Somos tão nós, que a vida nos reflete
como dois incansáveis andarilhos
através de velhice e mocidade.
Por tão imenso o amor, que nos repete,
renasceremos juntos em meus filhos
e chegaremos um, na eternidade

Saulo Ramos, Fora da lei: obra poética

Saulo Ramos

Saulo Ramos – Gruta

Saulo Ramos

Minha alma, a verdadeira, a única que tive,
está aqui, neste livro: o livro que me fiz
para guardar-me na ambição de ser feliz
como tudo que tem direito à vida e vive.
 
Eu sei que há flor, e sol, e luz; que existe o mundo,
mas minha alma nasceu nas grutas mais estranhas
e bebe sombras, bebe a gota que, no fundo
 
das grutas, treme e cai, filtrada das montanhas.
O amanhecer é tão pequeno para as grutas,
há tão pouco horizonte, e é tão rápida a aurora,
que a gente decora
a cor do sol
para supor a tarde
antes da longa noite
de túnel sem saída
por onde caminham o desespero
e as esperanças:
é quando, sem alarde e mansas,
aconchegam-se para dormir juntas
a morte e a vida.
 
Este é o livro que fiz
no fundo dessa gruta
abre-o de leve
e escuta:
há uma gota que escreve
na pedra de granito
um verso dolorosamente aflito
e desenha uma face
como se desenhasse
um grito.

Saulo Ramos, Fora da Lei: Obra poética