Bertolt Brecht

Bertolt Brecht – A moça afogada

1

Quando ela se afogou e a boiar foi descendo
Dos córregos para os rios mais caudalosos,
Brilhava o céu de opala tão maravilhoso
Qual se devesse recompensar o cadáver.

2

Sargaços e algas iam-na enleando,
De modo que ela aos poucos ficava com mais peso.
Frios os peixes nadavam-lhe pelas pernas,
Plantas e bichos faziam-lhe ainda mais lenta a última viagem.

3

E o céu da tarde era escuro feito fumaça
Retendo à noite o brilho das estréias sobre o horizonte.
Mas cedo alvoreceu, a fim de que também
Manhã e tarde houvesse para ela.

4

Quando seu corpo branco apodreceu nas águas,
Aconteceu (bem devagar) que Deus foi-a esquecendo:
Primeiro o rosto, as mãos depois e por fim os cabelos.
Então ela passou a ser no rio uma carniça igual a tantas outras.

Bertolt Brecht, Poemas e canções

Tudo é Poema

Publicado por
Tudo é Poema

Poemas Recentes

Pablo Neruda – Ausência

Ainda há pouco… Leia Mais

2 dias atrás

Margaret Atwood – Ah, crianças

Ah, crianças, vocês… Leia Mais

2 dias atrás

Jorge Luis Borges – O labirinto

Nem Zeus desataria… Leia Mais

3 dias atrás